Um brasileiro, uma paixão adormecida

Publicado  domingo, 2 de novembro de 2008

Neste final de semana, houve o desfecho do campeonato mais disputado de todos os tempos já visto na Fórmula 1 em Interlagos, São Paulo, com a consagração de Lewis Hamilton como o campeão mais jovem da história da categoria. Com 98 pontos, superou seu concorrente direto, o brasileiro Felipe Massa, por apenas um ponto e com um final dramático para a corrida que teve oportunidades diversas.

Massa conquistou a pole no sábado e Hamilton foi apenas o quarto colocado. O piloto da Ferrari precisava de uma combinação de resultados para obter o título: necessitava da vitória e que o piloto da McLaren chegasse no máximo em sexto ou se chegasse em segundo, o inglês somente poderia chegar em oitavo.

O imponderável começou marcar sua presença momentos antes da largada com uma leve chuva que serviu para alterar as táticas de todos presentes na pista. Tiveram que mudar o tipo do pneu para intermediário. O começo da corrida foi adiado por dez minutos.

Passado esse tempo, a largada foi tranqüila para os primeiros, que mantiveram suas posições, mas no pelotão foi tumultuada. David Coultard tocou nos dois carros da Williams e ficou atravessado na segunda perna do S do Senna. Assim, acabava a carreira do escocês que havia disputado 246 GPs. Quase simultaneamente, na curva seguinte, Nelsinho Piquet rodou sozinho, bateu e se despediu da prova. Desse modo, o carro de segurança entrou na pista, para que os acidentados pudessem ser retirados. Quando a corrida voltou à sua normalidade, o traçado foi secando gradativamente e obrigou uma nova mudança de estratégia, com a antecipação da parada para troca de pneus e reabastecimento. No retorno, Massa ainda se encontrava em primeiro, mas Hamilton estava apenas em sétimo. Nesse momento o campeonato estava voltado para o brasileiro. Contudo, algumas voltas depois, o inglês recuperou dois postos e a taça estava novamente em suas mãos.

O alemão prodígio, Sebastian Vettel, da STR, pressionou o piloto da Ferrari por algum tempo mas teve que fazer uma parada a mais que todos os outros, pois corria com o carro mais leve sendo necessária mais uma parada para reabastecer.

Faltando sete voltas para o final, mais uma vez o improvável deu o ar de sua graça no circuito, trazendo novamente a chuva para apimentar o drama. A princípio, não foi forte e os pilotos tentaram se manter na pista, mas tão logo a quantidade de água aumentou que todos se viram obrigados a parar para trocar novamente os pneus faltando quatro voltas, menos outro alemão, Timo Glock, da Toyota, que se aproveitou para saltar para o quarto lugar. Massa era o primeiro, Fernando Alonso vinha mais atrás, acompanhado do companheiro do brasileiro, o finlandês Kimi Räikkönen. Hamilton em quinto seguido de perto por Vettel.


A duas voltas do final, Hamilton errou na curva que dá para reta de chegada e o alemão passou. A torcida entrou em êxtase, pois o título caia no colo do brasileiro. Pela primeira vez, um piloto do Brasil tinha a chance de conquistar a tão sonhada glória de ser o melhor do mundo em casa. Faltava apenas conduzir o carro para que o roteiro de final feliz acabasse com um jejum de dezessete anos. O último campeão nacional foi Ayrton Senna, em 91, dirigindo uma McLaren.

Mas como o próprio Felipe Massa disse: "a corrida acaba só depois da bandeirada final. Assim é esse esporte." Felipe cruzou a linha de chegada em primeiro, obtendo sua décima vitória na carreira, a sexta neste ano e a segunda em Interlagos. Mas na mesma curva que Hamilton tinha escapado, Vettel e ele ultrapassaram Timo Glock faltando menos de 500 metros para a chegada. Como o piloto da Toyota arriscou ao não trocar os pneus, arriscou também para se manter na pista e pagou caro. Não conseguiu tracionar o carro na saída da curva fechada e defender a posição. Neste momento Massa comemorava, assim como toda sua equipe e seus familiares. Quando se deram conta que Lewis havia cruzado em quinto lugar, pairou um ar de perplexidade no autódromo. Ninguém entendia direito ou não queria acreditar no que estava acontecendo: Lewis Hamilton era campeão mundial de Fórmula 1 no Brasil. Nunca a música da vitória foi tão fúnebre como neste grande prêmio.

No pódio, Massa ouviu o hino, bateu no peito mostrando garra, se emocionou, recebeu pela segunda vez o troféu de vendedor do GP Brasil, foi ovacionado pela torcida, porém a comemoração acontecia na parte de baixo, com Lewis, seus mecânicos e engenheiros e seus familiares. À Ferrari, sobrou o consolo de campeã de construtores pela segunda vez seguida, a 16ª em toda história.

O mais importante, todavia, foi o resgate que Felipe proporcionou ao longo da temporada aos brasileiros, que não viam mais graça em assistir corridas após a morte do tricampeão Ayrton. Trouxe de volta a paixão e o fanatismo que o povo tem pelas disputas, pelas divididas e frenadas, pelas ultrapassagens, o orgulho de ver a bandeira no alto do pódio e ouvir o hino, a vontade de acordar todo domingo de manha para acompanhar mais um grande espetáculo e torcer pela música tema que vem regendo as vitórias desde Nelson Piquet. Particularmente, trouxe a emoção para os olhos de quem aqui escreve, que acompanha fervorosamente a categoria há tantos anos mesmo sem brasileiros disputando campeonatos, e que voltou a ter um ídolo para admirar e respeitar. Principalmente, trouxe de volta a vontade e o ímpeto de escrever e relatar os acontecimentos esportivos.

Fica as congratulações para Lewis, contudo, ao mesmo tempo, fica a esperança que 2009 será outro grande campeonato para todos os amantes da Fórmula 1 pelo o mundo e que dessa vez Felipe Massa consiga trazer esta alegria, colocando seu nome na história dos maiores de todos os tempos.